segunda-feira, julho 13, 2009

AS BESTAS HUMANAS
O objetivo do presente artigo é fazer reflexões sobre os caminhos que conduzem uma pessoa a tirar a vida de outra por motivo torpe. Classifico de bestas humanas indivíduos que não têm sentimento, e para eles qualquer prazer lhe diverte. Tanto faz depredar o patrimônio, matar um passarinho, como assassinar um ser humano. São os também chamados desajustados que vivem em nosso meio para praticar o mal. Nada se aproveita dessa gente. Aliás, a única coisa aproveitável seria, talvez, algum órgão para transplante; para salvar uma vida.Na semana que passou uma dessas bestas, de 22 anos, no interior de um ônibus, matou cruel e covardemente um idoso de 78 anos, aposentado, porque este não quis lhe entregar sua carteira que continha alguns trocados em dinheiro. Reagiu e levou um disparo de revolver na cabeça. O motorista do ônibus da Carris, o cobrador e o restante dos passageiros ficaram apavorados, mas se controlaram. Após a fuga do marginal o condutor do coletivo conseguiu levar o desventurado velhinho até ao hospital São Lucas, da PUC, mas chegou sem vida.Mais tarde, numa ação pronta e efetiva da Polícia o assassino foi localizado e preso na casa da mãe, na Vila Brasília em Porto Alegre. Com a maior desfaçatez, em princípio, negou a prática do crime jogando a culpa em um suposto cúmplice. Depois do aperto da polícia, acabou confessando. O nome da besta é Tiago Alves da Silva, que por mais vezes, segundo os registros policiais, praticou roubos na Av. Protásio Alves e na Estrada do Forte. A Criminologia, ao explicar o comportamento desse tipo de indivíduo se utiliza basicamente de três grandes grupos de modelos teóricos, a saber: biológico, psicológico e sociológico. Esses tristes episódios nascem, primeiramente, no pensamento para depois se materializarem. Respostas precisas, absolutas ou científicas são difíceis de alcançar, porque com as ciências humanas não se pode falar em precisão, além do que, as variáveis que afetam o comportamento humano se diferenciam de caso a caso. Porém, não podemos deixar de lembrar que algumas práticas educacionais e socias do cotidiano, já no passado, sinalizavam que os riscos eram incalculáveis. Que práticas são essas? Na atualidade, a Educação, tem sido revestida cada vez mais de uma roupagem tecnicista, que prioriza o acúmulo de conhecimento, a competição acirrada, a busca do sucesso. Este enfoque, lamentavelmente, tem provocado uma desestruturação freqüente do ser humano que, por sua vez, se reflete na realidade violenta de nossa sociedade. As famílias estão confusas, inseguras nos valores que deveriam estar transmitindo, preocupadas em serem tachadas de piegas, ultrapassadas. Os valores morais, éticos e religiosos de cada núcleo familiar então, passam a ser descartáveis vulneráveis. E assim, os caminhos para a violência vão ficando abertos, livres, e esta atrevida prática, sem pedir licença a ninguém, cresce em passos galopantes e, com uma velocidade incrível, se instala na família, na escola, nos clubes, nos bares, enfim nos ambientes sociais que deveriam estar salvaguardados destas influências. Incontestáveis são as situações de intolerância, frieza, transgressão a ética e a moral. As crianças e jovens estão perdidos porque os adultos, também perderam o rumo, sem saber para onde ir. É como se a tênue linha divisória entre o bem e o mal, entre o certo e o errado estivesse se apagando. Os mocinhos das novelas estão se tornando chatos insípidos aos olhos do público, enquanto que os vilões começam a ser considerados os grandes sedutores das tramas românticas.Então se volta para as influências ambientais, familiares, culpa-se o stress do cotidiano, a má influência da mídia, as más companhias, drogas, pobreza, imoralidade, etc. Elabora-se uma lista de causas e vai-se excluindo por critério eliminatório, se o individuo em questão teve uma “boa formação familiar,” freqüentou “boas escolas,” volta-se à investigação para as influências mais além, diríamos subseqüentes como: drogas, companhias, mídia, etc.Assim, alguns educadores confortavelmente, continuam em seu mundinho politicamente correto como se não tivessem nenhuma contribuição a fazer, caminham provocando em seus novos aprendizes a possibilidade de no futuro diante de uma frustração ser vítimas de uma morte psíquica para a qual não foram se quer alertados, quanto mais provocado a pensar.Para melhor compreender a participação do educador se faz necessário recorrer a alguns autores na expectativa de refletir práticas eficazes que poderão contribuir com caminhos possíveis para a busca de solução.Alguns casos amplamente divulgados pela imprensa podem contribuir para melhor esclarecer esta proposta reflexiva, faz-se necessário aqui esclarecer que tais fatos não terão por pretensão caráter julgador.A Tese da “Legítima defesa da honra” ficou famosa quando usada pelo eminente jurista –Evandro Lins e Silva- em defesa de seu cliente, Raul Fernandes do Amaral Street, o Doca Street, quando então julgado pela morte de sua companheira Ângela Diniz ocorrida em Búzios (RJ), em 1976. Depois de uma discussão acalentada, motivada por ciúmes, Doca Street, matou com quatro tiros a chamada "Pantera de Minas" - Ângela Diniz, uma mulher da alta sociedade - numa casa de praia. Doca tinha na época 42 anos, Ângela 32, dois jovens bonitos, famosos, educados, enfim, esclarecidos. O crime deixou de ser um caso policial e virou símbolo da luta pelo fim da violência contra as mulheres. Uma palavra de ordem correu o país: “quem ama não mata!”.Ironicamente, Doca, atualmente com 72 anos de idade, voltou à cena, recentemente, para anunciar em rede televisa nacional que pretende militar em defesa das mulheres que sofrem qualquer tipo de violência, causando mais uma vez polêmica na opinião pública. A mãe de Ângela, na época, fez a célebre pergunta a Doca:-Por que o senhor não morreu por amor?Atualmente, em pleno século XXI temos visto várias “mortes por amor”, fundamentadas neste argumento que nada tem a ver com honra, nem com defesa, pois a vítima quase sempre é pega a traição.Outra morte também provocada em nome do amor que chocou o país foi a que teve como protagonistas uma bonita universitária das ciências jurídicas, Suzane von Richthofen e os irmãos Cravinhos, que impiedosamente mataram os pais dela. Em seu primeiro depoimento, amplamente divulgado pela imprensa nacional e internacional a jovem acadêmica, acusada de ser a autora intelectual do delito, afirmava que “matou por amor ao namorado”, tese que não resistiu até seu depoimento em juízo, tal qual seu intenso amor.Não obstante a morte dos pais com requintes de crueldade planejados milimetricamente a jovem tem provocado a perplexidade da população pela sua frieza, ausência de indícios de arrependimento e outros sentimentos que seriam inerentes ao ser humano diante do fato definitivo de suprir “a vida” daqueles que lhe a proporcionaram.São inevitáveis os questionamentos: “Essa jovem é saudável psicologicamente”? “O que leva de fato uma pessoa matar os próprios pais”? Existe vida para ela depois de um fato dessa magnitude?Interessante notar que ao se fazer um paralelo ao mundo animal, observa-se que este fato, naquele universo tão precário, não acontece. Ali, ao contrário, eles exercitam o instinto de “preservação da espécie”. Lamentavelmente, a sociedade “civilizada” tem sido exaustivamente testemunha de histórias como a citada, e não é em vão que o caso Suzane inspirou uma adolescente de 12 anos na cidade de Franca /SP a se livrar da mesma forma dos pais que “a importunavam,”, entretanto, com menos recurso e menor potencial ofensivo, a infante não obteve êxito em sua empreitada e, portanto, o resultado desejado ficou relegado a “apenas tentativa de homicídio”.O filósofo, sociólogo alemão, Theodor Adorno, já no século passado, dizia que era preciso educar contra a barbárie.“(...) se as pessoas não fossem profundamente indiferentes em relação ao que acontece com todas as outras, excetuando o punhado com que mantêm vínculos estreitos e possivelmente por intermédio de alguns interesses concretos, então Auschwitz não teria sido possível, as pessoas não o teriam aceitado". (ADORNO, 1995, p. 119 e 134).A Alemanha após Auschwitz “fechou para balanço”, fez uma revisão em seu sistema educacional e na última Copa do Mundo de Futebol em 2006 pudemos assistir uma Alemanha afetiva, sorridente, mostrando ao mundo sua preocupação com a “alma coletiva”.Pensando nisso, pode-se entender que para os casos como os já citados, os educadores, precisam estar mais atentos, pois não há como se eles furtarem da participação efetiva, construtiva, transformadora de seus educandos, além do que são nítidas as dificuldades que se evidencia em aprender com o passado se este momento não for provocado.Senge (1999) em seu livro “A quinta disciplina” comenta que aprender e ensinar são dois lados da mesma moeda, que o ser humano vem ao mundo motivado a aprender, a explorar e a experimentar. Infelizmente, a maioria dos educadores, sejam eles pais ou professores de nossa sociedade acabam praticando mais o controlar do que o ensinar, recompensando o desempenho das pessoas em função da sua obediência a padrões estabelecidos e não por seu desejo de aprender. Os avanços do mundo moderno conduzem a humanidade, a cada dia mais, a buscar o processo de individuação, uma vez que, o mercado insiste em nos informar que só vence quem for o melhor entre seus pares. A competição não é mais tida com uma idéia perturbadora, mas sim como uma prática rotineira e porque não dizer obrigatória de nossa sociedade, assim à violência que chega de forma mansinha, quase invisível vai se instalando em nosso cotidiano como fruto do progresso, do desenvolvimento.É fato que não se pode alienar e dar as costas para os avanços do cotidiano, mas, por outro lado, observa-se, por exemplo, jovens insaciáveis, infelizes que buscam auto-realização no limite, no extremo e perigoso, no comportamento desregrado.Culpar os pais, as escolas, o acesso à informação, a acirrada competição no mercado de trabalho ou qualquer outra instituição como algoz daquilo que temos visto seria precipitado e imaturo. Os jovens não só praticam a violência como também são vítimas dela. Uma pesquisa da Unesco, intitulada "Mapa da Violência – Os Jovens do Brasil", traz dados preocupantes a esse respeito: mais de 24 mil jovens, entre 15 e 24 anos, morreram no Brasil somente no ano de 1996. As causas: acidentes de trânsito, homicídios ou suicídios. Assassinados foram mais de 15 mil. Isso evidencia que “os adultos” em geral, estão falhando em algum lugar na formação adequada do caráter deles. Quem são esses adultos? Pais? Professores? Sociedade? Diriamos que todos indistintamente, isto é todos aqueles que podem ser parceiros no sucesso de alguém podem também serem co-responsáveis pelo fracasso.Essas práticas que num passado não muito distante aparentemente só aconteciam longe da Academia Universitária estão cada vez mais se evidenciando dentro ou perto dela. Isso remete a indagação:Que profissionais estão sendo formados? Há um verdadeiro comprometimento com a ética? Com a moral? Os conceitos de liberdade, respeito ao outro, limites, juntamente com a conduta ética, moral, deveriam estar sempre muito claros e presentes nas práticas educacionais, do contrário corre-se o risco que tais valores em breve sejam considerados “letra morta” onde os costumes vigentes passam a se fortalecer de tal forma, que começam ser consideradas normas. Ai, neste caso, evidentemente, o compromisso dos educadores com a ética, com a moral e com o ensinar passarão a ser de ineficaz aplicabilidade .A psicanálise ajuda-nos a compreender alguns comportamentos manifestos pelos praticantes de tais atos, através de teorias elaboradas por Sigmund Freud(1856-1939), que recorreu à mitologia grega para explicar, por exemplo, os processos inconscientes, porque as pessoas sentem o desejo de matar quando se frustram. A mesma teoria tão minuciosamente estudada pelo médico neurologista judeu, que evidencia o desejo como fonte impulsionadora da ação, também alerta sobre a importância destes serem controlado, contidos. A compreensão da dimensão que o desejo pode representar numa ação, neste caso significa a libertação, mas não necessariamente a realização do pensamento encoberto.Os educadores nas mais diferentes esferas sejam no ensino fundamental, médio ou universitário devem estar provocando uma reflexão daquilo que pode permanecer e transformar a sociedade, que são as idéias.Vive-se num mecanismo tão incorporado de imediatismo, que a “espera” passa a ser vista como atitude do passado, não há tempo para contemplar, meditar, refletir e até para pensar.Enquanto a preocupação for o aqui e agora, nossos olhos verão a barbárie imperando, e sem dúvida, ela encontrará seus seguidores. Vai-se continuando quieto, como se nada estivesse acontecendo ou ainda como se nada pudesse ser feito.É comum ouvir-se de professores universitários que um dos fatores que contribuem para a criminalidade que aparentemente é maior que em momentos do passado é a presença dos presídios, como se a ausência deles pudesse modificar o quadro de violência que impera em nosso país, nosso mundo e na própria natureza humana.Ora, um argumento dessa estirpe é pelo menos fragmentado, frágil, a qualquer controvérsia um pouco mais estruturada e reflexiva e pode ser facilmente desmoronado, pois tais assertivas seguramente, não levam em conta o crescimento demográfico, os dados estatísticos do número de crimes cometidos em relação ao crescimento populacional, etc. Não se pretende aqui, discutir os motivos das atrocidades em nosso dia-a-dia, nem tampouco que os resquícios do mundo moderno como: o capitalismo, a competição, a individualidade, a sede do poder, do ter, entre outras banalidades, não são assuntos próprios para os educadores, mas seguramente se os “homens de bem” não assumirem seu compromisso na construção de uma sociedade mais consciente, mais madura, ficará cada vez mais utópica a ÉTICA, a MORAL, o AMOR, podendo num futuro próximo ser relegado a devaneios de uma mentalidade infantil. De maneira geral, considera-se constrangedor falar de esperança, da afetividade, da compreensão, mas a cada dia mais se tem visto as pessoas deixerem cair suas armaduras e mostrarem sua imensa necessidade de se sentirem acolhidas.A Universidade além de uma instituição onde se transmite o saber sistematizado é também um local onde se deve praticar o acolhimento, pois sem acolhimento não há prazer, e sem prazer não há como aprender. Se os educadores universitários estiverem, diariamente, sensíveis às atrocidades que se cometem no cotidiano e atentos ao papel que desempenham na construção do saber pode-se, sim, ensinar uma leitura diferente daquela, por exemplo, que a jovem estudante de direito que matou os pais fez: “família tem prazo de validade”.Do contrário que cidadão teremos amanhã? Que profissionais? Que governantes? Que legisladores? Que julgadores? Que professores?Aprender é prazeroso, é saboroso, pode e deve ser divertido, mas requer esforço, supõe privações, frustrações, enfim dificuldades que se inserem num processo onde a conquista está vinculada a escolhas conscientes. Para adquirir algo significativo, é preciso renunciar a diversos prazeres que na maioria das vezes são efêmeros e disso os educadores, entendem até por já terem passado por esse processo . Mais do que nunca é preciso que a Escola e a Sociedade caminhem juntas em busca de seu mais precioso bem: O SER HUMANO.O livro de Eclesiastes, no capítulo 3, das Escrituras Sagradas, cita que para tudo há um tempo determinado na terra, há tempo para todo o propósito debaixo do céu, ouso dizer que agora é chegado o tempo de refletir sobre os caminhos da humanidade e o que pode ser feito para que vivamos num mundo melhor.É preciso que os educadores ensinem os seus educandos a pensar , pois jovens viris, alegres, cheios de vida, podem também ser “adultos reflexivos”. Do contrário, os professores estarão contribuindo para a construção de “acadêmicos prisioneiros” de um sistema psíquico impiedoso, solitário, onde seu algoz jamais será sequer citado, quanto mais denunciado.O assunto é complexo pela sua essência; nele detectamos fatos, opiniões, motivações, sentimentos, por essa razão, a pretensão de elucidá-lo não é objeto desta reflexão, mas sem dúvida alguma a sua prática deve estar inserida no cotidiano do professor sob pena da sua omissão ou descuido ser tipificada como negligência.Ao se deparar com o jovem adulto contestador evidencia-se uma confirmação que o tempo chegou, um tempo de construção digna, responsável e integradora das diversas dimensões do humano, mas é preciso mais que uma teoria, que uma opinião, é preciso coragem para viver o que se ensina e ainda mais, para manter acesa a chama do desejo de estar sempre aprendendo.Quem sabe assim pode-se vivenciar ainda neste século, menos competição acirrada e mais cooperação mútua, menos dor e mais prazer, menos destruição e mais construção, menos ódio e mais amor, enfim, menos morte e mais vida.
Referências:
ADORNO, T. W. Educação e Emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. AMARAL,P. disponível no site: http://www.amaral.adv.br/textomes.htm
DELORS, J. Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI. 4ª ed. São Paulo: Cortez, 1996.
SENGE, P. A Quinta Disciplina. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999.Rede Globo. Reportagem exibida no Programa Fantástico disponível em ttp://fantastico.globo.com/Jornalismo/Fantastico/0,
Wikipédia . Portugal. Disponivel em www.pt.wikipedia.org acessado em 02/10/2006.

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